sexta-feira, 12 de agosto de 2011

As Três Faces da Mesma Moeda (Última Parte): o Xamã do Supermercado

Agora que já contei detalhadamente que sou uma soma esquisita entre 'desligamento', 'reserva extrema' e 'gentileza', fica fácil compreender que não é nada fácil conviver comigo. Eu não apenas trato as 'birutices' das pessoas - também posso deixá-la 'tortinhas'! Um vizinho ou balconista conhecido que passe por mim numa gôndola de supermercado ou nos corredores de um shopping pode ficar sem entender nadinha por eu simplesmente não 'olhar para ele'; por outro lado, alguém que tenha me visto passar 'alheia ao mundo' várias vezes num desses lugares, pode também ficar sem entender nada se algum dia cruzar comigo de manhã, nas ruas do condomínio, e receber o meu mais puro "Bom Dia". E minha família toma, aqui e ali, sustos curiosos, quando alguém ganha de presente algo que apenas sussurrou que queria e achou que ninguém - principalmente eu - tinha ouvido ou percebido o brilho nos olhos. Minha mãe disse que eu sou 'complicada' e eu assino embaixo! Eu, decididamente, assusto as pessoas. Mas como o feitiço sempre volta para o feiticeiro, um dia desses fui eu quem tomou um susto - e dos bons!

Estava eu num supermercado - o mesmo que frequento há anos por ser próximo do consultório - e como havia acabado de sair do trabalho, estava mais 'fora do ar' que o 'normal'. Quando cheguei na seção de verduras, me aproximei de uma bancada e fui pegar algumas batatas que estavam numa caixa. Havia ali um funcionário do supermercado organizando as mesmas e, como ele estava de costas e eu cheguei de mansinho, jogou, totalmente sem querer, uma batata em cima de mim. Ele percebeu o que fez e imediatamente se desculpou sem jeito. Eu olhei para ele, e com toda pureza que um Erê pode trazer (O Lado Bom da Mula Empacada), respondi que não havia problema, que sabia ter sido sem querer. Ele suspirou aliviado e eu voltei às batatas. Mas ele continuou me olhando e, de repente, com um sotaque andino, lascou: "Você tem os olhos da Águia. Voa lá em cima, mas mê tudo aqui em baixo."

Não é exagero dizer que eu prendi a respiração, abri ligeiramente a boca e minha cabeça de cachorrinho pendeu para o lado, toda perguntas. Olhando fixamente para ele, questionava: "como assim?!, ele conseguiu me definir sem me conhecer! Nem quem me deu à luz consegue! É ele, ou tem algum 'guia falador' do lado dele?" "É ele", respondeu meu guardião. E, como se quisesse dirimir quaisquer dúvidas sobre si mesmo, o Xamã continuou: "As coisas acontecem às pessoas e elas ficam se lamentando. Elas olham para o De Lá De Cima, com o nome que você quiser dar para Ele, e se queixam e reclamam. Mas você não. Você sabe que o que acontece é porque tem que acontecer. E que o Lá De Cima vê tudo." Só consegui responder "sim, é isto mesmo", e ele se virou e voltou às batatas, enquanto eu saía de fininho...

... isto aconteceu uns dias depois do Tsunami do Japão e sei que ele se referia ao sentimento das pessoas naquele momento, pois aqueles eventos reverberaram no inconsciente do mundo todo - e no meu consultório não foi diferente. Tive que lidar, durante algumas semanas, com perguntas do tipo "por que isto acontece?", "por que tamanho sofrimento?", e coisas do gênero. E parece que aquele Xamã, escondido sob a pele de arrumador de batatas, sabia que este era exatamente o assunto mais tratado por mim naqueles dias. Mas tenho agora a impressão que sua 'abordagem' tinha outros propósitos que meramente se fazer 'visto'. Este foi apenas um de uma sequência de 'episódios xamânicos' que emergiram 'do além' na minha vida e/ou na minha psique nas semanas e meses seguintes (Encontro com a Mulher Terra). Lógico que não me atrevo a dizer que seja a Águia meu Animal de Poder, mas pelas definições que encontrei depois, ela caminha - ou voa - bem pertinho de mim...

E, só para finalizar, comentei com a minha comadre sobre este Xamã e ela também ficou impressionada: sim, é a mais pura verdade - nem mesmo quem convive comigo há muito tempo conseguiria me definir tão bem! Portanto, da próxima vez que for a um supermercado, trate bem ao arrumador de batatas: se ele for um Xamã disfarçado, pode te retribuir a gentileza de uma forma bem inesperada.


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