quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Pele Vermelha, Alma Vermelha: o que conta é o coração

Uma das coisas que decididamente não posso fazer antes de dormir é ficar na frente do computador. A iluminação da tela superestimula meus neurônios e acabo com insônia. E nesta noite foi exatamente o que aconteceu - só consegui dormir depois das 4h. Vai ser lindo trabalhar hoje... Mas para não 'perder meu tempo', voltei para mais um encontro com as 13 Xamãs, pois estava com alguns pontos de interrogação me rondando.

Chego à mesma habitação de antes, mas agora as Xamãs me esperam do lado de dentro. Ergo uma cortina de contas que faz as vezes de porta e entro. Elas estão sentadas em círculo, em algo como uma pedra ou banquinho - não consigo ver direito. Uma delas vem me receber - não é a mesma do outro encontro - me saúda e me encaminha para o círculo me pondo sentada no chão. Digo que fui ler sobre elas e do pouco que já descobri, elas fazem parte das Nações de Pele Vermelha. Digo que também fui ler sobre o xale no livro As Cartas do Caminho Sagrado (Jamie Sams) e descobri que ele significa um 'retorno à Mãe', um retorno ao "lar", uma retomada de um estilo de vida - e não um objeto sagrado como havia visto no primeiro encontro. Explico que tudo isto me deixou confusa, pois em todas as minhas recordações de outras vidas, jamais me vi vivendo no solo da América e, portanto, não poderia ser considerada alguém que tenha uma 'alma vermelha', e que isto faz com que eu não me sinta merecedora da atenção delas. Algumas delas dão uma risadinha, como quando rimos de crianças muito pequenas que dizem alguma 'bobagem' e nos divertimos com o que ouvimos. A mesma que me recebeu toma a palavra e começa a me explicar.

"Você está certa, criança. Existe uma diferença entre tomar um xale enquanto objeto mágico, e tomar um xale enquanto estilo de vida. Mas você não entendeu direito o que é ter a alma vermelha. Antigamente, um xale era somente uma vestimenta, que algumas vezes era mágica, outras apenas aquecia. Nas nações que ficavam num mesmo lugar, e podiam ter um tear, ele poderia ser tecido; nas que viajavam em busca de alimento, ele era feito de peles. Neste mesmo tempo, os de duas pernas punham a mão no chão e agradeciam à Mãe e levantavam a mão para o céu e agradeciam ao Pai por tudo que faziam e por tudo que lhes aconteciam. Seus olhos e seus corações estavam voltados para esta realidade, e eles viviam em total consciência de que todos os seus atos deviam ter as bençãos do Pai e da Mãe para serem bem sucedidos. Assim, tudo que faziam carregava o potencial de ser sagrado e mágico, mesmo que fosse 'apenas' uma roupa para vestir. Mas se este tempo passou, e os de duas pernas se esqueceram de que dependem do Céu e da Terra para existirem, ainda é esta atitude de reverência e gratidão que define uma alma vermelha. Mesmo que esta alma nunca tenha vivido em uma pele vermelha, se ela põe a mão no chão e agradece e levanta a mão ao céu e agradece, ela é vermelha e tudo que faz carrega novamente o potencial de ser mágico. Você diz que não se considera digna de termos voltado nossos olhos para você, que não vive este estilo de vida. Mas eu te pergunto algumas coisas criança: quantos daqueles com os quais convivem lamentam a morte de uma árvore e passam meses se queixando por isto, como se lamentassem a perda de um amigo de duas pernas? Eu interrompo e digo que aquilo não foi justo, ela não tinha motivos para morrer e era a única da espécie num raio de muitos metros e que, de fato, mesmo que tenham me explicado que ela se foi por ter cumprido seu tempo, sinto falta das suas flores amarelas - eras dão de novo uma risadinha e minha professora continua: "Quantos daqueles que você conhecem, ao verem um passarinho roubando a ração do cachorro, ralham com ele dizendo que ração de cachorro não é comida de pássaro, como se ele fosse um ser consciente? Quantos, ao encontrar uma aranha dentro de casa, 'reclamam' com ela que ali não é seu lugar, e dão o tempo dela fugir antes de 'partir para um ataque' - e às vezes até fazem de conta que não a viram entrar, apenas para não ter que matá-la - e quando a encontram fora de casa, a deixam exatamente aonde está, sem a perturbar? Quantos resgatam lagartos da boca ou da tocaia dos cães e as põem em segurança em outro lugar? Quantos, ao cruzar de carro com uma cobra, mesmo venenosa, param ou desviam e a deixam seguir seu caminho, sem a matar? Quantos ao verem uma cobra entrar pelas frestas do muro e se esconder entre as folhas, simplesmente erguem os olhos para cima e dizem aos seres das matas que tomem conta e providenciem a retirada dela dali, virando as costas e indo embora sem se perturbar?" Interrompo novamente e as lembro que uma vez matei uma, mas não sinto orgulho disto. Ela assente com a cabeça e diz, "sim, você a matou, mas foi por você ou pelos seus cães?" Por eles, respondo. Ela continua: "Sim, sabemos disto. E nem vamos falar do lixo que você procura reciclar e nem da vergonha que sente ao produzir algum lixo ou deixar um alimento se estragar." Vocês vêem tudo isto?, pergunto, é então isto que faz 'uma alma vermelha'? "É a atitude, criança, o que você tem no coração e na mente. E mesmo que você saiba que não respeita como devia o seu próprio corpo, tem uma atitude de respeito e reverência por tudo que existe fora de você. E não somos nós quem vemos tudo isto, mas a Mãe Terra e o Pai Céu."


Agradeço pelas explicações e me despeço bastante reflexiva. Nunca imaginei que este meu 'jeito de ser', que para as pessoas parece pura birutice, chamasse de alguma forma a atenção de seres tão belos. E nem mesmo acho que isto tudo seja 'grande coisa', pois me parece 'o óbvio' a fazer.

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